julho 27, 2024

Produção de novilho precoce: o desafio de uma corrida por qualidade

Quem conhece o termo novilho precoce, logo o liga à palavra qualidade.  Rodrigo da Costa Gomes* Na indústria brasileira de carne bovina, cuja realidade é o abate acima dos 36 meses, participação de animais inteiros em praticamente 50% dos machos abatidos e poucos incentivos para melhorar a qualidade, o novilho precoce traz diferenciais importantes, seja pela qualidade da sua idade jovem entre 18 a 30 meses, pela carcaça com quantidade de gordura adequada, ou pela bonificação recebida que pode chegar a valores acima de 100 reais por animal. Entretanto, muito além destes aspectos, o contexto do novilho precoce é definido por outros detalhes, um conjunto de demandas, oportunidades e desafios que se configuram dentro e fora da porteira, muitas vezes equiparáveis aos de uma corrida, onde os beneficiários não são apenas o público desta corrida, ou seja, os consumidores, mas também todos os outros atores envolvidos na cadeia. Para compreender os desafios, é necessário saber que na base da produção de um novilho precoce estão três pilares decisivos que definem sua qualidade e também seu processo de produção. Adequar um lote destinado ao abate a determinado programa de bonificação de novilho precoce significa atender majoritariamente aos critérios de idade, acabamento e peso, em mais de 50% ou até 80% dos animais daquele lote, com o direito assim de receber uma bonificação financeira. Da parte do pecuarista, o desafio está não só em atender os critérios com os níveis exigidos, mas principalmente em equilibrar o diferencial de remuneração recebido frente ao custo de se adequar o lote aos critérios de qualidade. Para a indústria frigorífica e o varejo é, acima de tudo, estimular a cultura da qualidade e demonstrar de forma concreta e transparente a importância que isto terá para a cadeia. E é na busca de equilíbrio que a produção de novilho precoce se assemelha a uma corrida. Como em uma prova de rali de regularidade, onde o piloto que vence não é aquele que percorre o percurso no menor tempo, mas sim o que trabalhou no ótimo entre estratégia e velocidade, assim é a produção de novilho precoce. Neste caso, o produtor é o piloto que chegou ao pódio, por otimizar recursos que levassem seu animal às características corretas, no tempo correto e com a melhor relação benefício/custo. Se no rali o equipamento e a estratégia de guiar são determinantes para chegar até o fim, também o são os animais e o sistema de produção animal adotados na produção de novilho precoce, uma vez que estes são as chaves para se alcançar tanto a qualidade da carcaça, quanto o equilíbrio financeiro necessários. Não é uma corrida fácil e a equipe responsável pela busca do melhor carro e da melhor estratégia tem papel fundamental. No novilho precoce, esta equipe pode ser representada pelos grupos atuantes na pesquisa e na transferência de tecnologia nesta área, verdadeiros engenheiros e estrategistas, responsáveis por descobrir e difundir as técnicas de produção necessárias para um percurso mais eficiente. Como disse um nobre colega “para problemas sistêmicos, soluções sistêmicas” e, desta forma, deve ser entendido o desafio para as equipes de pesquisa e transferência de tecnologia, pois isto se traduz na necessidade de uma postura multidisciplinar, conectada à realidade e focada no problema. Tirar deste desafio uma oportunidade de valorização pelo setor produtivo pode representar o pódio para os inseridos neste contexto. Com a mesma visão que se desvenda uma oportunidade para quem o estuda, se enxerga o benefício que o novilho precoce entrega dentro da porteira. Regularidade em um percurso é algo que se tem depois de agregado um conjunto de elementos que se complementam e entregam o melhor na busca de eficiência. O piloto habilidoso, o carro robusto e potente e o GPS acurado e ágil representam estes elementos. Assim acontece na produção do novilho precoce. Ninguém chega a resultados sem esforços para agregar os elementos necessários. Genética e pasto podem não ser eficientes isoladamente, mas quando em conjunto e complementados pelas técnicas de manejo e alimentação adequadas, dão caminho aos resultados. E é aí que a fazenda inteira ganha. Não só pelo novilho precoce, mas pelo conjunto de melhorias alcançadas na base com a consolidação de um sistema de produção eficiente, que pode levar a melhorias em até 30% na rentabilidade, apenas pelo fato de diminuir a idade de abate em 12 meses. Em resumo, para a pecuária (e os demais envolvidos com ela!), o novilho precoce não deve ser entendido apenas como uma meta, mas principalmente como um caminho. E para quem está nesta corrida, seja piloto, equipe ou público, todos têm a oportunidade de sair ganhando e subir ao pódio nesta verdadeira corrida por qualidade. *Rodrigo da Costa Gomes é pesquisador em Nutrição Animal na Embrapa Gado de Corte – rodrigo.gomes@embrapa.br Fonte: Embrapa Gado de Corte/ Foto: Rodrigo Gomes

Búfalos no Pantanal

Considerações sobre os prós e contras do uso destes animais para evitar ataques de onças sobre bovinos Walfrido Moraes Tomas*  Algumas pessoas defendem a ideia de que criar búfalos asiáticos (Bubalus bubalis) junto ao rebanho bovino no Pantanal pode resultar em uma diminuição dos ataques de onças pintadas sobre o rebanho. Dentre os termos utilizados para incentivar esta prática, cita-se a implantação de uma “barreira de búfalos” entre áreas com onças e o rebanho bovino. No entanto, é preciso ponderar esta abordagem de uma forma mais ampla ao invés de se indicar soluções e tomar decisões baseadas em uma visão restrita do problema – como é o caso. Isto é relevante porque os impactos que podem ser causados por búfalos em áreas úmidas, nas quais são introduzidos, são consideráveis e previsíveis.  Primeiro, é preciso aceitar que não existem evidências concretas de que esta estratégia realmente leva a uma diminuição da predação. Além disso, temos que considerar o fato de que a predação de gado por onças no Pantanal atinge menos de 3 % dos rebanhos ao longo de um ano, com tendência a ser de 1% a 2%. Raríssimas são as situações em que este percentual é maior. Analisando a situação do ponto de vista econômico, o impacto não é maior que aquele provocado por outras fontes corriqueiras de perdas nos rebanhos, como doenças, acidentes, maus tratos, cheias e baixa qualidade zootécnica.  Ou seja, é possível que a predação por onças possa ser compensada através de outras estratégias que ofereçam menos riscos que a introdução de búfalos. Considerando os riscos representados pela criação de búfalos no Pantanal, é fácil entender por que o remédio pode ser “amargo” demais – e isso já é uma realidade em diversas áreas da planície inundável. São muitos os fatores que precisam ser levados em conta, buscando uma abordagem responsável, baseada no princípio da precaução. As fazendas pantaneiras são grandes – muitas, com dezenas de milhares de hectares, contendo áreas de difícil acesso. Soma-se a isso o fato de que búfalos, em períodos de cheias intensas, costumam escapar das invernadas onde são mantidos, não respeitando cercas e nem águas mais profundas. Uma vez “alongados”, tornam-se agressivos e difíceis de manejar, e acabam constituindo populações de animais asselvajados. Esta situação tem se repetido em diversos locais, como no norte da Austrália, no vale do Guaporé, em Rondônia, na Baixada Maranhense e nas planícies costeiras do Amapá, para citar alguns. Sem predadores, as populações crescem e se estabelecem facilmente. Os resultados são catastróficos. Nas planícies de inundação do vale do Guaporé, em Rondônia, cerca de quatro mil búfalos asselvajados originaram-se de uma tentativa realizada por meio de um programa do governo estadual, que começou com cerca de 40 animais na década de 1950, na fazenda Pau D’Óleo. Com o tempo, esses animais se multiplicaram, alteraram o relevo, a hidrologia e causaram impactos consideráveis na vegetação dentro da Reserva Biológica (REBio) do Guaporé, de cerca de 600 mil hectares.  No Amapá, mais de 30 mil búfalos existem dentro da REBio Lago Piratuba, de 400 mil hectares. Os impactos destes animais no micro relevo levaram à salinização de sistemas de lagos de água doce, erosão e remobilização de sedimentos que assorearam rios, causaram graves impactos na vegetação, afetando a biodiversidade. Na Estação Ecológica Maracá-Jipioca, constituída de uma grande ilha na costa do Amapá, há uma população de algumas centenas de búfalos asselvajados, da raça Carabao, afetando também a vegetação nesta unidade de conservação. Esses impactos são idênticos aos encontrados no Parque Nacional de Kakadu, no norte da Austrália, cuja população de búfalos asselvajados nunca foi eliminada, apesar de esforços neste sentido por parte do governo australiano. Portanto, exemplos da capacidade de estabelecimento de populações asselvajadas de búfalos e seus impactos não faltam. Na desejada análise mais ampla que defendemos, é preciso também considerar o aspecto cultural. Os peões pantaneiros não gostam de lidar com búfalos, uma vez que estes exigem cuidados diferentes dos bovinos, com manejo diário. Geralmente, os peões argumentam que os búfalos não obedecem como o gado bovino (com os quais estão acostumados a trabalhar, uma cultura desenvolvida por mais de dois séculos no Pantanal), apresentando comportamento mais complicado e respondendo pouco ao desejo dos peões. A consequência disso pode ser um manejo negligente, resultando em escape e abandono dos animais, com o estabelecimento de grupos asselvajados. Em 2015, um funcionário de uma fazenda na Nhecolândia foi morto por um búfalo “bagual”, como são chamados os animais asselvajados na região, aumentando o temor e a rejeição a este animal na cultura local. Mas este não é o único caso de ataque – há relatos, inclusive, destes animais se jogando na água para perseguir pessoas em canoas. A Embrapa Pantanal realizou um mapeamento de populações de búfalos com dados obtidos de levantamentos aéreos realizados no início da década de 1990, apontando várias ocorrências de populações asselvajadas no bioma. Atualmente, pelo menos dez populações são conhecidas na planície inundável: na região da Corixa Grande e ao sul da fazenda Descalvados, em Cáceres (MT); no norte da região do Paiaguás; na região da Palmeirinha e nas proximidades da Boca do Caronal (próximas ao rio Taquari); na região do Jacadigo; nas proximidades do Forte Coimbra, em Corumbá; na região da foz do rio Tereré, em Porto Murtinho, e no Brejo do Taboco, em Aquidauana (MS). Entretanto, é possível que haja mais localidades do Pantanal com búfalos “alongados”. Estas populações variam de poucas dezenas a centenas de animais, localizados em regiões consideradas perigosas pelos moradores e trabalhadores locais.  Além disso, os búfalos asselvajados não possuem qualquer tipo de controle de doenças, como a brucelose, a tuberculose e várias outras. Isso representa um risco muito grande para os rebanhos domésticos, que podem ser contaminados por essas enfermidades – assim como a fauna silvestre. Entre as espécies expostas a este problema estão algumas classificadas oficialmente como ameaçadas no Brasil, como o cervo-do-pantanal (Blastocerus dichotomus). Não há estudos sobre os impactos da presença destes animais em um sistema frágil como o Pantanal, nem mesmo

Nem só de PO vive a pecuária

P.O. significa “puro de origem”. Daí surgem também as expressões POI, LA e Cara Limpa. Uma das funções da ABCZ, por delegação do Ministério da Agricultura, é cuidar do registro genealógico das raças zebuínas no Brasil, mas não é a única: elas podem ser muito mais abrangentes. Carlos Viacava* Trata-se de uma missão valiosa, porque preserva a genealogia do nosso rebanho de origem indiana (“bos indicus”), como também é valiosa a missão de outras associações de raças a quem compete o registro do gado de origem europeia (taurino ou “bos taurus”). Para o melhoramento genético, é importante o conhecimento da genealogia correta, por várias razões, inclusive para se conhecer o grau de consanguinidade de um acasalamento ou mesmo de um rebanho inteiro. Para tornar economicamente viável esse controle genealógico, estabeleceram-se taxas ou encargos para os pecuaristas que por ele se interessassem, taxas essas que compõem a principal receita da ABCZ e que só são suportadas pelos criadores porque há uma isenção total do ICMS para esses animais. Ou seja, o controle genealógico só subsiste porque é subsidiado pelo poder público estadual e por um arcaico sistema tributário, que no caso específico realiza uma bitributação, porque o ICMS é pago novamente na venda da carne. Deixando de lado o problema das distorções de nosso sistema tributário e pensando em melhorar a pecuária e a carne brasileiras, devemos considerar que só uma pequena parte do gado brasileiro é PO, ou é controlada pela ABCZ, cujo público alvo é uma minoria do nosso rebanho. Por isso, acredito que a missão da ABCZ pode ser muito mais abrangente quando envolver também os rebanhos de gado hoje fora de seu controle, que compõem a maioria dos animais existentes. Toda fazenda de cria, recria ou engorda pode aumentar sua eficiência se contar com um apoio técnico de custo acessível envolvendo a identificação dos animais e o melhoramento genético. Para se alcançar resultados no melhoramento genético é importante a genealogia, mas ela não é peça indispensável desde o início. Pode-se iniciar com a identificação dos animais, e pouco a pouco, a cada nova geração, irá sendo construído o pedigree dos indivíduos. Os valores cobrados hoje pela ABCZ para registro de nascimento, registro definitivo, participação no melhoramento genético, etecetera são muito altos para atrair novos criadores. Pode-se dar um apoio muito grande a inúmeros criadores com um assessoramento técnico que inclua a adoção de programas de melhoramento existentes no Brasil, inclusive o da ABCZ, que recentemente desenvolve programa próprio, mas sem desprezar os demais, sem querer monopolizar as ações. Deixemos o mercado resolver o que é melhor para cada um, com liberdade. Claro que esse assessoramento técnico tem um custo, mas será um custo muito inferior se não houver exigência dos certificados atuais de nascimento, registro definitivo, multas e outras cobranças desnecessárias. Quem não precisar desses documentos pode dispensá-los e assim mesmo produzir uma melhoria em seu criatório obtendo avanço expressivo na performance e nos resultados econômicos. *Carlos Viacava é pecuarista e titular da marca CV Nelore Mocho Fonte: Newsprime

Menor consumo de carne pode piorar o aquecimento global

Boa parte das emissões de gases de efeito estufa tem sido atribuída à pecuária. Na verdade os números chegam a 15% das emissões totais. Ciro Antonio Rosolem* Há gente que diz que a pecuária estaria emitindo mais que carros, caminhões e ônibus. Na verdade os dados são baseados em estimativas pontuais, sem levar em conta todo o processo produtivo. Por exemplo, se contabiliza quanto o boi emite, mas não se considera que o boi come capim que fixa carbono. E fixa bastante. Há muitos estudos demonstrando que simplesmente a melhoria da produtividade das pastagens tropicais resulta em maiores estoques de carbono no solo. Uma pastagem melhorada remove aproximadamente 1 tonelada de carbono da atmosfera por hectare por ano, quando comparada a uma pastagem degradada. Muito bem, pastagem melhorada sequestra carbono, pastagem degradada emite carbono. Isso não é novo. O que é novo está em um trabalho publicado na revista Nature Climate Change, em janeiro deste ano, por uma equipe de pesquisadores da Universidade de Edimburgo, no Reino Unido, junto com pessoal da Embrapa. É o trabalho de tese de Rafael de Oliveira Filho. A equipe desenvolveu um modelo matemático muito complexo, que leva em conta todas as emissões de carbono geradas na produção pecuária, mas também contabilizou o carbono sequestrado pelas pastagens que fica no solo. A conclusão foi que, se a demanda por carne bovina aumentar, haverá diminuição da emissão de carbono pela pecuária, desde que o desmatamento seja controlado. Ao contrário, se a demanda, e a produção diminuírem, as emissões serão aumentadas. A explicação é a seguinte: maior demanda por carne vermelha resultaria em incentivo para aumento da produção e melhoria das pastagens. Pasto melhorado, carbono fixado. Grama bem tratada tem raízes mais fortes e profundas, colocam o carbono lá embaixo. Foi estimado que um aumento de 30% na demanda de carne até 2030 poderia reduzir em 10% as emissões de carbono pela atividade. Mesmo com mais cabeças de gado emitindo gases, a absorção pela pastagem seria maior, mais que compensando esse aumento. Haveria menor emissão tanto por quilo de carne produzida como total. Por outro lado, menor demanda por carne significaria rebanhos menores que precisariam de menos pasto. Demanda menor, preços mais baixos. Isso reduziria a capacidade de investimento dos produtores, assim como o incentivo para manter pastos produtivos. Os pastos se degradariam, o solo perderia matéria orgânica, gerando maior emissão de carbono para a atmosfera. O trabalho indica ainda que a restauração de pastagens degradadas se constitui na maior oportunidade para atingir as metas traçadas no plano nacional de mitigação de emissões de gases de efeito estufa. A restauração de 15 milhões de hectares de pastos degradados até 2020, como planejado, se constituiria numa contribuição equivalente a 40% das reduções propostas até 2020. Os vegetarianos, veganos e que tais que me desculpem, mas um bom churrasco pode diminuir o aquecimento global. É o tal do churrasco ecológico. Tem notícia melhor? Sobre o CCAS O Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) é uma organização da Sociedade Civil, criada em 15 de abril de 2011, com domicilio, sede e foro no município de São Paulo-SP, com o objetivo precípuo de discutir temas relacionados à sustentabilidade da agricultura e se posicionar, de maneira clara, sobre o assunto. O CCAS é uma entidade privada, de natureza associativa, sem fins econômicos, pautando suas ações na imparcialidade, ética e transparência, sempre valorizando o conhecimento científico. Os associados do CCAS são profissionais de diferentes formações e áreas de atuação, tanto na área pública quanto privada, que comungam o objetivo comum de pugnar pela sustentabilidade da agricultura brasileira. São profissionais que se destacam por suas atividades técnico-científicas e que se dispõem a apresentar fatos concretos, lastreados em verdades científicas, para comprovar a sustentabilidade das atividades agrícolas. A agricultura, apesar da sua importância fundamental para o país e para cada cidadão, tem sua reputação e imagem em construção, alternando percepções positivas e negativas, não condizentes com a realidade. É preciso que professores, pesquisadores e especialistas no tema apresentem e discutam suas teses, estudos e opiniões, para melhor informação da sociedade. É importante que todo o conhecimento acumulado nas Universidades e Instituições de Pesquisa seja colocado à disposição da população, para que a realidade da agricultura, em especial seu caráter de sustentabilidade, transpareça. Mais informações no website: http://agriculturasustentavel.org.br/ . Acompanhe também o CCAS no Facebook: http://www.facebook.com/agriculturasustentavel . *Ciro Antonio Rosolem, Vice-Presidente de Estudos do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) e Professor Titular da Faculdade de Ciências Agrícolas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (FCA/Unesp Botucatu). Fonte:CCAS/ alfapress

Quanta água tem na carne

Você já ouviu falar dos famosos 15 mil litros de água necessários para se produzir um quilograma de carne vermelha. Uma afirmação que pode até ser verdadeira, mas que dita assim, fora do contexto e sem análises adicionais, é no mínimo, injusta Luiz Josahkian* Nos fóruns internacionais um dos temas recorrentes é o uso consciente da água, uma preocupação legítima, presente em qualquer lista de prioridades de governos, instituições ou pessoas. Na produção animal, a primeira abordagem sobre o uso dos recursos naturais foi proposta por William Rees e Mathis Wackernagel no início dos anos 1990. Eles criaram um indicador chamado pegada ecológica (PE) que indica a área em hectares necessária para a produção de um determinado produto. Mas foi somente em 2002 que Arjen Hoekstra, da Universidade de Twente (Holanda), introduziu um novo indicador e o batizou de pegada hídrica (PH) o volume de água usado durante a produção e o consumo de bens e serviços. A PH tornou possível a cada cidadão se autoavaliar como consumidor. Até aí, tudo certo. Cuidar do planeta é uma obrigação. Mas as discussões ficam polarizadas e perdemos a capacidade de encontrar as soluções mais equilibradas e factíveis, já que não faz parte da lista de opções da humanidade deixar de se alimentar. Como é de praxe, a pecuária foi para a berlinda. As pegadas hídricas estimadas colocam a criação de gado, especialmente a de corte, como líder no consumo de água. Só que é preciso considerar muitos aspectos. Água azul é aquela proveniente de fontes naturais rios, lagos ou fontes subterrâneas. É a mais sensível entre as três classificações. Água verde tem origem no ciclo natural da água das chuvas, desde que não seja perdida por escoamento, e que alimentam o solo, o qual, por sua vez, alimenta as plantas e retorna ao ciclo hídrico. Água cinza é a necessária para remover os poluentes de um determinado sistema de produção, mais demandada em sistemas industriais e outras atividades intensivas e de transformação de produtos. Na pecuária, o uso mais expressivo é o da água verde, aquela que naturalmente se integra ao ambiente e é transformada, via solo e planta, em energia e proteína. A PH indica que 94% do total de água consumida na produção de carne vermelha é água verde e ainda, que 98% dessa água são absorvidos através do alimento. Apenas 1,1% é água bebida. Nesse contexto, a produção a pasto é a mais equilibrada do ponto de vista do consumo de água. Neste sistema não há competição com a alimentação humana porque ninguém come capim. A água consumida via alimento se perderia via evapotranspiração das plantas caso não fosse transformada pelos ruminantes em proteína nobre. Já a pecuária intensiva, baseada na alimentação com grãos, acaba sendo mais produtiva sob o ponto de vista de redução de tempo de abate e da produção relativa de energia/proteína por unidade de consumo. Contudo, há nesses sistemas intensivos um aumento no uso de água azul, de forma direta ou na produção de grãos que irá alimentar o gado. O desafio da pecuária é descobrir o boi que cresça e termine rápido a pasto, consumindo, essencialmente, água verde. Afinal, toda água doce um dia chega ao mar. Se nesse trajeto uma pecuária consciente colocar vacas, touros e bois bebendo um pouco de água para produzir eficientemente proteína nobre, isso será apenas a natureza tal como ela foi feita e somente melhorada por nós e para nós mesmos. Melhor encontrarmos uma pecuária otimizada, onde os bois, com seus milagrosos rumens povoados de bactérias, fungos e protozoários do bem, continuem operando de forma sustentável o milagre de transformar capim em proteína nobre para o nosso sustento. *Luiz Josahkian é superintendente técnico da Associação Brasileira dos Criadores de Zebu (ABCZ)

Qual o X da questão no agronegócio?

O X da questão no agronegócio não está em bombardear a ciência e a tecnologia, ou suas empresas e pessoas José Luiz Tejon Megido* O X da questão significa competência e responsabilidade em toda cadeia agroalimentar. Existe uma ação, eu diria ingênua ou mal intencionada de associar a produção alimentar do Brasil a uma cachoeira de veneno, agrotóxico ou defensivos. Ou seja, o nome que você prefere para o controle de pragas, doenças e ervas daninhas. O X da questão está em não querer destruir a ciência e a tecnologia, ao invés de corrigir a consciência do seu uso, e o conhecimento da sua utilização, ou enganar a população com o falso terror de ao comer uma manga, melão, estar comendo a maçã envenenada da bruxa da Branca de Neve. Da mesma forma, considero desonestidade brutal associar os agricultores brasileiros, que significam hoje exemplo de empreendedorismo e cooperativismo, a envenenadores vampirescos e toda categoria agronômica responsável pelos receituários em falsários. Irresponsável é quem faz e promove esta malévola percepção. Menciono aqui o texto que acabei de receber da Dra. Agrônoma, Anita Gutierres, do Ceagesp. Ela diz: “As cenas apresentadas na novela Velho Chico com trabalhadores lavando pulverizadores costais no rio, de mangas colhidas após a aplicação de agrotóxicos são muito improváveis e, se ocorrerem, o coronel poderia ser preso pela fiscalização da Defesa Sanitária Vegetal”. E a Dra. Anita ainda explica que a legislação brasileira é tão severa quanto a dos países mais avançados e que no negócio da exportação somos fiscalizados e obrigados a seguir padrões de elevada exigência como Global GAP e FDA. Temos muito a fazer? Sim. E nisto também vale uma autocrítica do setor que precisa e deve investir em recursos e verbas muito mais amplas na comunicação educadora de todos os agentes envolvidos na cadeia agroalimentar. Então, o X da questão no agronegócio não está em bombardear a ciência e a tecnologia, ou suas empresas e pessoas. E sim termos muitos investimentos em comunicação educadora das práticas corretas no campo, que asseguram a boa alimentação. E nisso, o Brasil tem áreas de excelência na sustentabilidade e na responsabilidade social do seu agronegócio. Os produtores brasileiros geram riqueza e alimentos para o Brasil e o mundo. Não os trate como envenenadores, eles são trabalhadores. Eis aí o X da questão. Sobre o CCAS O Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) é uma organização da Sociedade Civil, criada em 15 de abril de 2011, com domicilio, sede e foro no município de São Paulo-SP, com o objetivo precípuo de discutir temas relacionados à sustentabilidade da agricultura e se posicionar, de maneira clara, sobre o assunto. O CCAS é uma entidade privada, de natureza associativa, sem fins econômicos, pautando suas ações na imparcialidade, ética e transparência, sempre valorizando o conhecimento científico. Os associados do CCAS são profissionais de diferentes formações e áreas de atuação, tanto na área pública quanto privada, que comungam o objetivo comum de pugnar pela sustentabilidade da agricultura brasileira. São profissionais que se destacam por suas atividades técnico-científicas e que se dispõem a apresentar fatos concretos, lastreados em verdades científicas, para comprovar a sustentabilidade das atividades agrícolas. A agricultura, apesar da sua importância fundamental para o país e para cada cidadão, tem sua reputação e imagem em construção, alternando percepções positivas e negativas, não condizentes com a realidade. É preciso que professores, pesquisadores e especialistas no tema apresentem e discutam suas teses, estudos e opiniões, para melhor informação da sociedade. É importante que todo o conhecimento acumulado nas Universidades e Instituições de Pesquisa seja colocado à disposição da população, para que a realidade da agricultura, em especial seu caráter de sustentabilidade, transpareça. Mais informações no website: http://agriculturasustentavel.org.br/ . Acompanhe também o CCAS no Facebook: http://www.facebook.com/agriculturasustentavel * José Luiz Tejon Megido, Conselheiro Fiscal do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS), Dirige o Núcleo de Agronegócio da ESPM, Comentarista da Rádio Jovem Pan. Fonte: CCAS / Alfapress

“O Brasil não conhece o Brasil”

Esse pequeno verso correu o país e ficou famoso na década de 1980, na voz da cantora Elis Regina, interpretando a canção “SOS Brasil”, do compositor Tom Jobim. Coriolano Xavier* Nenhum dos dois viveu para ver o nascimento do Cadastro Ambiental Rural — CAR, que traz uma fotografia fundiária e produtiva do país, desvendando o Brasil interior para os brasileiros.  O cadastro foi implantado pelo Ministério do Meio Ambiente há cerca de quatro anos, para dar transparência fundiária ao país e quantificar o nosso passivo ambiental — e o prazo normal para cadastramento dos produtores rurais terminou recentemente, em maio. Concretamente, o CAR é uma plataforma digital com imagens de satélite, onde o proprietário rural indica o tamanho da sua propriedade, suas divisas e tipo de ocupação das terras, ou seja, áreas produtivas e áreas de vegetação conservada ou degradada. Entre os macro benefícios do cadastro, um é facilmente identificável: com ele, em tese será possível dar mais efetividade ao Código Florestal (instituído em 2012), que define o uso produtivo dos vários biomas existentes em nosso território. Outra vantagem é que será possível planejar e monitorar mais objetivamente o alcance das metas com as quais o Brasil se comprometeu na 21ª Conferência do Clima da ONU (Paris, novembro de 2015), como contribuição brasileira no combate às mudanças climáticas: fazer uma intervenção pró-sustentabilidade em cerca de 30 milhões de ha, até 2030, recuperando 15 milhões de ha de pastagens degradadas, restaurando 12 milhões de ha de florestas e promovendo a integração lavoura-pecuária-floresta em outros cinco milhões de ha. Informação representa mais eficiência ao se fazer as coisas. Significa clareza dos problemas e maior objetividade nas soluções. Com o CAR o Brasil ganha. A começar pelo próprio agronegócio que poderá tirar proveito dessa base de informações, aumentando o conhecimento e a inteligência de produção e sustentabilidade do campo. O governo e a sociedade civil vão ter acesso a informações do que ocorre no meio rural, estabelecendo políticas públicas mais realistas e direcionando investimentos de forma mais eficiente e sustentável. Dá até para dizer que começa um tempo novo para a sustentabilidade no País, pois 77% da área das propriedades foram cadastradas até o término do prazo, representando cerca de 2,8 milhões de propriedades rurais. Isso revela que a adesão que falta é predominantemente de pequenas propriedades e de modo mais sensível no Nordeste.  Uma realidade que vai exigir apoio e estímulos para adesão do pequeno agricultor, o que também pode representar uma oportunidade para articular comunidades e fortalecer iniciativas cooperativistas pelo interior do Brasil. Mais da metade dos produtores cadastrados no CAR até agora aderiu espontaneamente ao Plano de Regularização Ambiental, para regularizar ou compensar áreas verdes desmatadas ou degradas. Alguém pode dizer: isso foi pressão social, olho da lei, fantasma de exclusão do crédito ou, claro, também aumento de consciência ambiental entre os produtores. Diria que é tudo junto e não importa o peso de cada uma. O fato é que está se construindo uma realidade de maior responsabilidade ambiental no campo, abrindo a porteira para um futuro mais sustentável da agropecuária. Sobre o CCAS O Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) é uma organização da Sociedade Civil, criada em 15 de abril de 2011, com domicilio, sede e foro no município de São Paulo-SP, com o objetivo precípuo de discutir temas relacionados à sustentabilidade da agricultura e se posicionar, de maneira clara, sobre o assunto. O CCAS é uma entidade privada, de natureza associativa, sem fins econômicos, pautando suas ações na imparcialidade, ética e transparência, sempre valorizando o conhecimento científico. Os associados do CCAS são profissionais de diferentes formações e áreas de atuação, tanto na área pública quanto privada, que comungam o objetivo comum de pugnar pela sustentabilidade da agricultura brasileira. São profissionais que se destacam por suas atividades técnico-científicas e que se dispõem a apresentar fatos concretos, lastreados em verdades científicas, para comprovar a sustentabilidade das atividades agrícolas. A agricultura, apesar da sua importância fundamental para o país e para cada cidadão, tem sua reputação e imagem em construção, alternando percepções positivas e negativas, não condizentes com a realidade. É preciso que professores, pesquisadores e especialistas no tema apresentem e discutam suas teses, estudos e opiniões, para melhor informação da sociedade. É importante que todo o conhecimento acumulado nas Universidades e Instituições de Pesquisa seja colocado à disposição da população, para que a realidade da agricultura, em especial seu caráter de sustentabilidade, transpareça. Mais informações no website: http://agriculturasustentavel.org.br/ . Acompanhe também o CCAS no Facebook: http://www.facebook.com/agriculturasustentavel *Coriolano Xavier, Vice-Presidente de Comunicação do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS), Professor do Núcleo de Estudos do Agronegócio da ESPM. Fonte: CCAS / Alfapress