Pecuaristas cobram melhores políticas públicas
Lideranças do segmento reclamam que a atividade ficou em segundo plano nos últimos anoOs novos desafios da pecuária de corte brasileira exigirão ações mais contundentes do governo, afirmam lideranças do segmento, que reclamam que a atividade ficou em segundo plano nos últimos anos e perdeu espaço nas políticas públicas para a agricultura e a produção leiteira. As principais demandas são mais crédito e assistência técnica. “Temos acesso mais restrito a recursos que a agricultura, pelas características do nosso ciclo produtivo”, disse ao Valor o presidente da Associação dos Criadores de Nelore do Brasil (ACNB), Nabih Amin El Aouar. “Isso habituou o pecuarista a não procurar crédito. De certa forma é bom, porque não houve grande endividamento. Mas quem não investe fica limitado à forma antiga de se produzir.”O modelo extensivo, no qual o aumento da produção está diretamente ligado à abertura de novas áreas, está chegando ao fim. As lavouras de grãos avançam pelos rincões do país e continuarão tomando espaço dos pastos pouco produtivos. “O crescimento da pecuária será vertical, mas para isso precisamos de tecnologia”, diz El Aouar.Oswaldo Ribeiro Júnior, diretor-presidente da Associação dos Criadores de Mato Grosso (Acrimat), Estado que abriga o maior rebanho bovino do país, afirma que o governo precisa investir na linha de crédito para a recuperação de pastagens degradadas. “Nosso maior patrimônio é o pasto, mas é caro recuperá-lo”, explica. Ele também pede a ampliação dos recursos para a retenção de matrizes, que permitirá ao produtor arbitrar melhor suas vendas.O presidente da Associação Nacional da Pecuária Intensiva (Assocon), Maurício Velloso, afirma que o crédito agrícola muitas vezes tem prazo de pagamento de três a quatro vezes maior que o ciclo da cultura. “Já a pecuária, que tem um ciclo às vezes de cinco anos, conta com financiamentos de um ano. Isso obriga o pecuarista a pegar um financiamento para pagar outro, o que impede investimentos de longo prazo”, diz.“No Brasil, temos o melhor pecuarista do mundo, mas também temos o pior”, extrapolou o presidente da ACNB, para explicar que a heterogeneidade da pecuária local abre espaço para avanços. Enquanto os mais tecnificados esbanjam índices de produtividade por hectare, alguns mal sabem quantos animais têm.Para o diretor da Athenagro e coordenador do Rally da Pecuária, Maurício Palma Nogueira, antes de falar em crédito é preciso discutir a difusão de conhecimento para diminuir o abismo entre esses perfis. “É preciso melhorar a comunicação governamental em relação ao que precisa ser feito nas fazendas”, diz.Nogueira sustenta que muitos pecuaristas estão alheios às transformações do negócio, que agora tem margens menores. “O grande desafio é criar essa demanda por assistência técnica, porque serviços nós já temos em secretarias municipais e estaduais e em universidades e unidades da Embrapa. Até técnicos da iniciativa privada fariam acordos, porque as empresas querem vender mais produtos”, afirma.Segundo Gabriel Garcia, presidente da Associação Brasileira dos Criadores de Zebu (ABCZ), é preciso expandir iniciativas como os “dias de campo”. “Mais do que em empresas, o produtor confia no sucesso do outro. Precisamos mostrar que gastar dinheiro com tecnologia é investir”, diz o dirigente.A presidente da Associação Brasileira de Angus, Mariana Tellechea, lembra que o peso dos recentes aumentos dos insumos sobre a pecuária é notório. “Além dos grãos, essenciais para a formação da ração animal, há outros itens que tiveram aumento acima da inflação, como químicos para correção de solo, sementes para formação de pastagens, combustíveis e energia elétrica”, elenca.Nesse sentido, Mariana defende que o governo continue estimulando, por meio de linhas de financiamento de longo prazo, a compra de equipamentos de irrigação e de armazenamento de água. “Parece uma solução mais eficiente do que falarmos em formação de estoque públicos, que é uma opção pouco viável no Brasil frente à deficiência de armazéns e aos gastos logísticos para o deslocamento de grãos de áreas mais abastecidas para as mais carentes”, defende.SustentabilidadePara as lideranças, o governo é preciso também haver segurança jurídica para que o produtor se sinta confortável em investir. “A gente precisa de tranquilidade para trabalhar. Não podemos produzir e, ao mesmo tempo, nos preocuparmos com invasões de terra e novos impostos”, diz o presidente da ACNB.Ribeiro Júnior, da Acrimat, lembra que, diferentemente de uma lavoura de soja, que leva poucos meses do plantio à colheita, um boi de alto padrão é abatido perto dos dois anos. “O pecuarista não gosta de virada brusca, porque é uma atividade de ciclo longo”, afirma.Entre as mudanças necessárias, Maurício Palma Nogueira afirma que o governo precisa parar de tentar empurrar para o pecuarista o papel de polícia. “Não é o empresário que tem que investir e investigar o outro para saber se o bezerro que está sendo comprado vem de uma área desmatada. O governo precisa dizer: este produtor está ilegal, não compre dele”, pontua.Segundo Nogueira, nenhum governo conseguiu criar medidas efetivas para lidar com o desmatamento ilegal. “A Izabella Teixeira [ministra do Meio Ambiente no governo Dilma] conseguiu reduzir drasticamente o desmatamento, que depois voltou. É preciso ir em cima do ilegal, porque toda vez em que o desmatamento aumenta, alguém quer criar uma regra nova para pressionar quem está operando dentro da lei”, diz.Nabih Amin El Aouar diz que é preciso separar produtores e bandidos, e reafirma o compromisso do setor produtivo com o Código Florestal. “Mas como vamos preservar mais do que o que já está estabelecido sem nada em troca? Nós não recebemos nada, e ainda, se porventura houver uma adversidade que não foi causada por nós, como um incêndio, arcamos com o ônus”, frisa.Mariana Tellechea afirma, ainda, que o Brasil precisa avançar com consistência na regulamentação da legislação de créditos de carbono para dar clareza ao produtor sobre a mensuração e certificação de um balanço das emissões de gases do efeito estufa nas propriedades. “Acreditamos que o setor pode ser uma fonte importante de geração de créditos de carbono, um ativo com previsão de alta demanda já no médio prazo”, diz. ]Ribeiro Júnior diz que os negócios de crédito de carbono ainda são poucos e acontecem de maneira