julho 27, 2024

Como se justifica a prospecção de petróleo em plena bacia amazônica quando as energias limpas e renováveis já são uma realidade?

Por MARISA RODRIGUES

Legenda: Vazamento de petróleo na Amazônia equatoriana.

O presidente Lula não deve estar conseguindo dormir direito, apesar de sua cama ultraconfortável que custou aos cofres públicos a bagatela de R$ 42 mil reais. Isso porquê, neste mês de maio, não páram de pipocar notícias antagônicas ao seu plano de Governo. A penúltima, da semana passada, veio da Petrobrás que submeteu ao Ibama um pedido de autorização para perfuração de poços de petróleo em plena bacia amazônica, a 500 kms da Foz do Rio Amazonas, e a 175 kms do Amapá. Bem, a estatal tem o direito de tentar prospectar novos poços onde bem entender, mas deveria respeitar a decisão do Ibama, que negou essa autorização. E o que ela fêz? Se fêz de tonta, e disse que vai entrar com recursos para ter o seu pedido analisado novamente pelo Ibama. Ou seja, respeito zero pela palavra do mais importante instituto brasileiro sobre o nosso meio-ambiente. Deu, literalmente, de ombros.

Ocorre que isso demonstra uma tremenda contradição dentro do próprio Governo Lula, que se elegeu com a bandeira de proteção ao Meio-Ambiente, prometeu desfazer tudo o que o ex-presidente Bolsonaro tinha feito, contrário a essa causa – e parte dessas promessas já cumpriu, restaurando todos os órgãos que haviam sido extintos, ou simplesmente, aniquilados, como o próprio Ibama, ficando sem funcionários para exercer seus papéis de fiscalização e vigilância da nossa Amazônia –, mas não é só isso que precisa ser feito. Há que se continuar se posicionando frontalmente contra qualquer tentativa de qualquer órgão, estatal, privado, ou simplesmente, de garimpeiros ou madeireiros ilegais que tentam se instalar e roubar, dilapidar, destruir a Floresta Amazônica.

No caso específico da Petrobrás, embora esse pedido já tivesse sido feito no Governo anterior, o presidente da estatal. Jean Paul Prates, foi escolhido e empossado neste Governo. Portanto, no mínimo ele deveria estar alinhado com os esforços da Ministra Marina Silva, e seu Ministério do Meio Ambiente, para saber que a Amazônia deve ser protegida de qualquer ação que possa alterar o seu ecossistema e causar prejuízos a sua biodiversidade. Não tem como explorar petróleo numa região de reserva e proteção de etnias indígenas, sem que eles fiquem expostos a um possível derramamento de óleo, sem contato com brancos e suas perversidades.

A  história nos mostra que a exploração de recursos fósseis nem sempre é benéfica a longo prazo. Os Estados Unidos, por exemplo, enfrentaram dificuldades e consequências negativas significativas devido à dependência do carvão como fonte de energia. Além dos impactos ambientais, essa dependência levou a problemas de saúde pública, degradação dos ecossistemas e dificuldades econômicas em regiões dependentes da indústria do carvão. Essa experiência serve como um lembrete importante de que a busca por novos poços de petróleo pode ter implicações socioeconômicas e ambientais muito sérias para o País, sem contar que sua imagem, no exterior, fica totalmente manchada e desacreditada. E não só a do Brasil, mas também do Governo do presidente Lula e até de sua própria pessoa, que prometeu cuidar da Amazônia durante sua campanha eleitoral, como se fosse cuidar de um bebê indefeso, ganhou as eleições muito em função dessa promessa, pois nos horrorizava, enquanto cidadãos, ver e acompanhar de perto, pela imprensa, tudo o que se fêz contra o bioma amazônico, no Governo anterior.

No século XXI, em meio aos desafios impostos pelas mudanças climáticas e a necessidade urgente de se adotar fontes de energia mais limpas e sustentáveis, a tentativa de se obter uma licença para exploração de petróleo na Amazônia é uma questão polêmica e extremamente controversa. No mínimo, denota falta de sensibilidade da diretoria da Petrobrás que obviamente, assistiu à tragédia que se abateu sobre o povo Yanomami, no início do ano, quando cerca de 100 crianças perderam suas vidas por falta de assistência da Funai, que os deixou morrer à míngua, sem tratamento, alimentos ou medicamentos. Estavam morrendo a céu aberto, sem nenhum socorro, como insetos, e teriam morrido todos os integrantes da etnia, não fosse a mudança de Governo em primeiro de janeiro, e obviamente, a mudança de postura que isso trouxe para dentro dos órgãos responsáveis pela preservação das comunidades indígenas, entre eles, o Ibama que, ao ser desmontado, deixou de cumprir com suas obrigações de fiscalizar e expulsar madeireiros e garimpeiros ilegais de suas terras, o que acabou contaminando os rios com mercúrio e matando os seus peixes, base da alimentação dos indígenas.  

Por outro lado, como se já não bastasse por si só, essa situação que requer extrema delicadeza no seu trato, temos a questão do petróleo, um recurso fóssil, no outro lado da balança. Seu uso desenfreado ao longo dos anos tem contribuído significativamente para as mudanças climáticas. A queima de combustíveis fósseis libera gases de efeito estufa, como o dióxido de carbono, que estão diretamente relacionados ao aumento da temperatura global. Diante desse cenário, cientistas e pesquisadores ambientais, além dos ativistas, argumentam que a exploração de novos poços de petróleo é incompatível com a busca por um futuro sustentável. E é mesmo.

Afinal, nossa Floresta Amazônica é conhecida mundialmente por sua biodiversidade exuberante e, por isso, desempenha um papel crucial na estabilidade climática global. A busca por petróleo nessa área trazem riscos ambientais que incluem possíveis derramamentos de óleo, poluição, degradação do ecossistema e impactos negativos na fauna e flora, com consequências irreversíveis para a população indígena que mora e vive desse habitat. Antes de se tomar uma decisão dessas, faz-se mais do que necessário ponderar —  cuidadosamente — os benefícios econômicos dessa ação  em relação aos riscos ambientais e climáticos, que à primeira vista, de qualquer leigo, parecem ser muito mais danosos ao meio ambiente do que qualquer benefício advindo da exploração de poços de petróleo na região.

Mesmo porquê o uso das energias renováveis é uma questão inadiável, se quisermos uma alternativa viável aos combustíveis fósseis. Os carros híbridos ou elétricos já são uma realidade incontestável. Eu mesma constatei nesta semana, numa ida a uma clínica oftalmológica, várias vagas de garagens, no estacionamento, com baterias para recarga de carros elétricos. Ou seja, tais equipamentos já fazem parte do nosso cotidiano, embora ainda inacessíveis para a maioria dos mortais, do ponto de vista do preço, mas isso é só uma questão de tempo, talvez menor do que imaginamos, se a sociedade realmente se conscientizar dessa necessidade, diante das tragédias que se avizinham com a aceleração das mudanças climáticas e passarem a exigir dos seus governantes que invistam tudo o que puderem, e com celeridade, no avanço do uso de energias limpas, como a solar, eólica, hidrelétrica, geotérmica e de biomassa, que são exemplos de fontes renováveis que não emitem gases de efeito estufa durante suas operações.

Se pensarmos que esses poços de petróleo que a Petrobrás quer explorar na Bacia Amazônica levarão no mínimo, sete anos, para começarem a produzir, ou seja, em 2030, até lá, muito provavelmente, a maioria das nossas frotas, de carros de passeio aos veículos de transporte pesado, já deverá ter mudado sua matriz energética para energia elétrica ou de combustível limpo como o etanol. Portanto, trata-se de um investimento altíssimo que será desperdiçado, pois a rápida evolução da tecnologia nesse campo tem tornado as energias renováveis mais acessíveis e, economicamente, competitivas.

Além disso, já é mais do que sabido que investir nessas alternativas pode impulsionar a economia, gerar empregos e, o mais importante, ajudar a mitigar as mudanças climáticas. Só não enxerga isso quem quer ter lucros imediatos com essa e outras explorações de petróleo que estão à caminho. Resta saber quem são esses indivíduos e expurgá-los do setor. A sociedade, como um todo, tem que ficar de olhos bem abertos, pois, novamente, estamos diante de um estelionato eleitoral, ainda que dessa vez, o presidente Lula não tenha nada a ver com isso, mas seu Governo tem.

(*) Marisa Rodrigues é fundadora do portal Boi a Pasto, do qual também é publisher. È jornalista formada pela Fundação Educacional Cásper Líbero e também formada em Letras pela Unesp – Campus de Assis, com licenciaturas plenas em Lingua e Literatura Portuguesa, Inglesa e Alemã. Consultora de comunicação integrada, foi assessora de imprensa do Grupo Matsuda, empresa líder no Brasil em pesquisas de novas forrageiras e segunda no ranking em suplementos mineirais, durante vinte anos, período que adquiriu a campo sua expertise em meio-ambiente, agronegócio e nutrição animal, além de ter feito diversos cursos e especializações nesses assuntos durante esse período.

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