julho 27, 2024

Everton Krabbe defende mais ciência e inovação na avicultura

Chefe-geral da Embrapa Suínos e Aves questiona até quando a comunidade científica vai ficar inerte aos avanços que estão acontecendo ao redor mundo, salientando que é preciso agir, empregar mais tecnologias nos processos, criar patentes, aprimorar ferramentas para que o setor se sobressaia e ganhe espaço em um mercado que está cada vez mais competitivo.

O que os consumidores modernos desejam do setor avícola? Com esse questionamento, o chefe-geral da Embrapa Suínos e Aves, Everton Luís Krabbe, deu início a palestra sobre “A ciência enfrentando velhos e novos desafios” na Latin American Scientific Conference (PSA Latam) – Conferência Científica Latino-Americana de Ciência Avícola, realizada em outubro na cidade de Foz do Iguaçu, PR.

Com a tecnologia como aliada, o consumidor contemporâneo busca por uma maior autonomia para escolher produtos e serviços, além de valorizarem a experiência na compra. “O consumidor atual pesquisa, compara e então compra. Diante deste perfil, se o meu produto tiver uma proposta inovadora provavelmente eu tenho maior chance de conquistar o desejo de compra desse consumidor. É preciso se reinventar, buscar novas alternativas e inovar para se diferenciar no mercado. Temos muitas oportunidades, mas para alcançá-las é necessário aprimoramento”, inicia Krabbe, que é mestre e doutor em Zootecnia.

Conforme a Organização Mundial de Propriedade Intelectual, os 10 países mais inovadores do Hemisfério Norte solicitaram cerca de 2.444,57 milhões de patentes em 2021, com a China liderando esse ranking com 695,400 mil pedidos. “Entendemos a China como um país que copia e faz mais barato, porém quando eu falo que a China lidera o número de patentes no mundo todo é preciso perceber que o país vive um novo momento”, expõe o chefe-geral da Embrapa Suínos e Aves, complementando: “Então precisamos pensar o que isso representa para nós do ponto de vista de negócio e de perspectiva para o futuro. A China está fazendo um investimento absurdo para que até 2025 cerca de 13% do Produto Interno Bruto seja oriundo de negócios que envolvem inovação”.

Chefe-geral da Embrapa Suínos e Aves, Everton Luís Krabbe: “A nossa comunicação precisa ser eficiente, é necessário entender o consumidor para saber sobre o que e como conversar com ele” – Fotos: Jaqueline Galvão/OP Rural

Enquanto no Hemisfério Sul foram registrados em 2020 exatas 7.123 mil patentes, uma média de 1.018 pedidos com base nos sete países mais inovadores. O Brasil ocupa o 1º lugar com 5.280 mil pedidos de patentes, o que representa 0,75% em relação ao país chinês. “Uma patente fornece proteção de invenção ao titular por um período de até 20 anos. O índice brasileiro é muito baixo quando se trata de inovação, até quando vamos continuar com essa realidade? Hoje com essa gama de startups que possuem uma proposta de negócio inovadora, aliada a iniciativas de empresas privadas e setores públicos, é preciso que estes setores se comuniquem para estarem cada mais conectados, trabalhando junto para interagir e reunir esforços”, congrega Krabbe.

Até quando?

O pesquisador questiona até quando a comunidade científica vai ficar inerte aos avanços que estão acontecendo ao redor mundo, salientando que é preciso agir, empregar mais tecnologias nos processos, criar patentes, aprimorar ferramentas para que o setor se sobressaia e ganhe espaço em um mercado que está cada vez mais competitivo. “Falando de fábrica de rações, de equipamentos, de aditivos etc., o que que a ciência pode fazer pensando nas indústrias de alimentos, porque nós não temos muitas certezas de como vai ser a disponibilidade de matérias-primas no futuro, muito em função obviamente de problemas geopolíticos e das mudanças climáticas”, pontua Krabbe.

O doutor em Zootecnia sublinha que atualmente cerca de 70 a 75% do custo de produção está concentrado na alimentação, expondo que diante desta variação é muito importante que seja mensurado com precisão essa variabilidade de matérias-primas. “Há vários sistemas de medição, o que nós precisamos é saber como aproveitar melhor essas informações e para isso contamos com a  ciência para encontrar uma maneira de fazer com que a tecnologia nos ajude no monitoramento das variações dentro das indústrias para que consigamos fazer uma manutenção mais precisa, porque não é possível que sigamos produzindo alimentos com essa variabilidade toda em matérias-primas sem que isso seja medido de forma mais precisa”, expôs Krabbe.

Chefe-geral da Embrapa Suínos e Aves, Everton Luís Krabbe: “Hoje já tem pesquisas que oferecem as condições ideais para fazer essa carne ser análoga a peito, a coxa e a asa, então é uma questão de tempo e de custo para esse produto entrar no mercado”

Nutrição

A respeito da nutrição dos animais, o chefe-geral da Embrapa Suínos e Aves diz que ainda há muito o que fazer nesta área para acelerar a conexão entre o campo e a fábrica. “Acredito ainda que a nutrição será feita fora da fábrica de ração, que deve ser mais uma etapa da produção e o ajuste dos níveis ideais para atingir determinado desempenho dos animais vai ter que ser feito direto na granja. Vamos precisar de sistemas inteligentes de alimentação que consigam lá no campo fazer os ajustes através de combinações e dietas para que a gente consiga sair dessa lógica de alimentação diária por fase”, sustenta Krabbe.

Em relação a produtividade do plantel, o profissional afirma que já estão sendo desenvolvidos sistemas que usam da inteligência artificial para captar o som das aves afim de interpretar a condição do bem-estar desse animal, o que vai contribuir para identificar, com maior rapidez, dentro dos lotes aquelas aves que não são produtivas.

Destinação de animais machos

Outra questão levantada por Krabbe foi em relação a destinação dos machos que nascem nos incubatórios para produzir pintainhos para a indústria de ovos, visto que, segundo ele, existem movimentos ambientalistas questionando seriamente para onde são enviados esses animais machos. “Nós precisamos achar meios de trabalhar com isso. Existem propostas, por exemplo, de trabalhos que sugerem que esses animais machos sejam criados e que a gente produza carne a partir deles, o que honestamente, considerando a indústria atual de proteína animal, não sei se é possível fazer isso em todas as partes do mundo”, pontua, ampliando: “Agora ficarmos eliminando animais recém-nascidos em massa é algo problemático e que tem uma repercussão social muito grande”.

Sistemas de aquecimento

Conforme Krabbe, os sistemas de aquecimento usados nas camas dos aviários instalados na América Latina, em sua maioria, são a base de queima de madeira, no entanto, ele enfatiza que as áreas de reflorestamento não estão sendo reflorestadas à medida que as árvores são cortadas. “Se os preços do milho e da soja estão lá nas alturas o produtor começa a pensar se vale apena reflorestar uma área que ele consegue ter muito mais receita por área produzindo grãos. E claramente é isso que estamos percebendo nos últimos anos, o que detona que estamos caminhando para uma lógica de redução drástica de oferta de madeira para produção de pellets, maravalha, cavaco etc, sem esse material o que vamos fazer, porque a quantidade que o produtor utiliza é imensa”, diz Krabbe.

Ao expor sua preocupação, o chefe-geral da Embrapa Suínos e Aves propõe aos cientistas que ajudem o setor avícola a encontrar uma alternativa para que possam se antecipar a possível falta de madeira no mercado. “Cientistas nos ajudem, pensem em aditivos que possam fazer com que o avicultor possa alterar a troca de uma cama de aviário a cada 12 ou 15 lotes. O que precisamos fazer para que não tenhamos emissão de gases a partir desta cama impacta no bem-estar do animal e em seu desempenho e é neste ponto que os cientistas podem nos ajudar, porque esse é um grande desafio da cadeia produtiva”, menciona.

Mas será mesmo que o setor precisa continuar aquecendo os animais usando madeira quando há sol praticamente o ano inteiro na América do Sul? Fonte de energia renovável, o sol é abundante e permanente, não polui e nem prejudica o ecossistema, características que fazem do ‘astro rei’ uma das alternativas energéticas mais promissoras no enfrentamento dos desafios do novo milênio. “Será que podemos trabalhar com energia solar, transformá-la em energia térmica, armazenar de alguma forma essa energia para quando chegar o próximo lote conseguir trabalhar por troca de calor e jogar esse calor dentro das instalações aviárias?”, questionou Krabbe à plateia da palestra.

Abatedouros

De acordo com uma pesquisa realizada em 2015 pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp), o consumo médio de água ao longo de todo o processo industrial de uma planta frigorífica, com abate diário de 100 mil aves/dia, representa em torno de 506,815 m3/dia, que em um mês de trabalho (22 dias úteis) corresponde a 11.149,93 m3.

Diante desse cenário e da água que sabemos não é um bem infinito, Krabbe diz que os abatedouros buscam alternativas como o tratamento da água para seu reuso. “Esse é um grande desafio da produção: ter água em quantidade e com qualidade. Nós produzimos somente no ano passado mais de 14 milhões de toneladas de carne de frango, tem que haver uma maneira de reutilizar essa água, tornar essa água limpa de forma que possa ser aproveitada pela segunda ou terceira vez dentro do frigorífico. Nós precisamos ser cada vez mais conscientes do papel que exercemos e a ciência pode ser uma de nossas aliadas nesse processo, porque toda tomada de decisão e legislação futura começa pela ciência”, expõe.

Carne de laboratório

O doutor em Zootecnia lembra que a carne cultivada em laboratório é uma das grandes apostas para atender a demanda futura por proteína. Para as próximas três décadas, estima-se que a demanda de proteína para alimentar a população mundial deva crescer 88%. “Nos últimos três anos tivemos uma evolução muito grande na produção de carne em laboratório. Hoje já tem pesquisas que oferecem as condições ideais para fazer essa carne ser análoga a peito, a coxa e a asa, então é uma questão de tempo e de custo para esse produto entrar no mercado” vislumbra.

Krabbe também chama atenção para o tempo de validade dos produtos de origem animal. “Precisamos pensar na questão de extensão de vida dos produtos, porque demandam muito investimento em termos de refrigeração e que, talvez, através da ciência possamos encontrar outros caminhos”, expõe.

Consumidor

A pandemia foi determinante para a mudança de comportamento do consumidor, que passou a ter preferência para fazer suas compras pela internet. Estimativas apontam que as tendências de consumo propagadas durante o período de isolamento social cresçam cada vez mais. “Nós precisamos entender que temos que desenvolver produtos inteligentes, porque o consumidor de hoje busca cada vez mais por produtos prontos e de fácil preparo. Eu não vejo futuro em carnes sem nenhuma agregação de valor, nem mesmo o frango inteiro. Claro que existe uma parcela da população que ainda compra muito mais por necessidade, mas e para aquele que vive sozinho, nós temos hoje oferta de proteína de origem de aves para esse perfil de consumidor?”, pergunta Krabbe.

Ele destaca que entender os consumidores é fundamental para que a indústria se comunique adequadamente, ressaltando que a busca pela inovação e por conhecer o mercado deve ser constante afim de agregar valor aos produtos de origem avícola. “Nós temos cenários incertos, não sabemos o que vai acontecer com o setor de carnes, o que sabemos é que vamos ter uma população crescente até 2050 – quase 10 milhões de habitantes – e para atender essa demanda é urgente a necessidade de inovar os processos em todos os elos da cadeia, além de entender as necessidades dos consumidores”, ressalta.

Krabbe enfatiza que entender o perfil ideal de proteína que o consumidor consome é fundamental para atender a demanda interna e externa. “A nossa comunicação precisa ser eficiente, é necessário entender o consumidor para saber sobre o que e como conversar com ele: será que tenho que falar de perfil ideal de proteína, sobre digestibilidade ou será que tenho que me reinventar e começar a ter uma linguagem que ele nos entenda? Uma coisa é certa, é necessário entender as percepções dos consumidores”, salienta.

Fonte: O Presente Rural

Curadoria: Boi a Pasto

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