O licenciamento ambiental foi instituído no Brasil através da Lei 6.938 publicada em 1981, como instrumento da Política Nacional de Meio Ambiente e com critérios definidos de preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental para manutenção do equilíbrio ecológico.
Andre Donha *
Na mesma época, também foi criado o Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente) com a competência de estabelecer normas e critérios para a licença de atividades potenciais poluidores. Já em 1988, no processo de edição da Constituição Federal do Brasil, instituiu-se o estudo de Impacto Ambiental/Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) como preceito para instalação de obra ou atividade potencial causadora de danos ao meio ambiente. No ano seguinte, atribuiu-se ao Ibama, órgão do poder executivo federal, o licenciamento ambiental de empreendimentos e atividades de significativo impacto ambiental no âmbito nacional ou regional, ou na ausência ou inépcia de órgãos originalmente competentes (atribuídos originariamente aos órgãos estaduais do meio ambiente).
A partir desse contexto legislativo complexo foi instaurada uma série de controvérsias e debates sobre a competência para o licenciamento ambiental, afinal os conceitos trazidos da Lei 6.938 são indefinidos e sujeitos a interpretações díspares. Dessa forma, os órgãos ambientais estaduais foram instalando seus próprios procedimentos, o que gerou tratamento diverso a situações semelhantes. Para resolver essa pendência, em 1997, a resolução 237 do Conama procurou dar uma resposta aos problemas de competência e procedimentos que passam a ser mais uniformes. Mesmo assim, o que vimos é uma controvérsia quanto a sua constitucionalidade, gerando posições antagônicas entre órgãos ambientais e empreendedores, demora na emissão de licenças e exigências burocráticas.
Vale ressaltar que o licenciamento é um processo ainda evolutivo, com questões que deveriam ser endereçadas, como a ausência de planejamento integrado entre os setores econômico e ambiental. Fica claro que falta delimitação do que está na governança da gestão ambiental em contraposição a instâncias responsáveis pelo processo produtivo. Além disso, há dúvidas quanto a quem deve ser atribuída a decisão pela emissão da licença, quais os limites do instrumento e quais os complementares e a caracterização de grandes passivos socioeconômicos já constituídos nos locais que serão afetados pelos empreendimentos em licenciamento ambiental.
Desde que foi instituído até os dias de hoje, o licenciamento enfrenta uma gama de desafios frente aos programas de desenvolvimento, que passa pelo processo de condução da licença (competência ou procedimento) até a racionalização do instrumento. Entre os principais entraves também estão os sociais, o desenvolvimento por pressão socioeconômica, o alinhamento dos custos de atividades fabris e do custo do processo de licenciamento, além de uma forte demanda por informações por parte de entidades de governos, Ministério Público, representantes comunitários, ONGs, sócios e parceiros.
Além desses problemas, não podemos deixar de elencar pontos importantes que levam à morosidade nos processos de licenciamento ambiental. Em uma extensa lista constam questões como a inconsistência entre órgãos quanto à competência de regulação; subjetividade das demandas levantadas pelos técnicos e variabilidade entre processos; necessidade por parte dos técnicos avaliadores em se resguardar quanto a licenças fornecidas em decorrência da Lei de Crimes Ambientais; estrutura ineficiente para o processamento da demanda atual; compensações ou condicionantes não condizentes com os possíveis impactos que serão gerados; número de exigências excessivas por parte dos órgãos ambientais, o que dificulta o andamento e a regularização de muitos processos, entre outras.
Um outro ponto relevante diz respeito à dinâmica existente entre o negócio e o licenciamento. Um posicionamento passivo da área e a baixa interação na gestão para implantação de empreendimentos abre espaço para a ineficiência na gestão dos investimentos e nos custos de operação. Além disso, muitas vezes, o atendimento às condicionantes ambientais não faz parte da pauta quando decisões operacionais são tratadas. E, em muitas vezes, o papel do setor de licenciamento apenas é observado em situações críticas e o atendimento às demandas do processo de licenciamento é diluído em diferentes áreas com metas diferentes como o marketing, Relacionamento Institucional e Responsabilidade Social. Entretanto, sempre após grandes eventos causadores de desastres ambientais importantes, é retomada a discussão da importância de superar esses empecilhos e o tema volta a ser o foco nas discussões de planejamento de tais empreendimentos, relacionando responsabilidade, conformidade com a legislação ambiental e investimentos.
Apesar de todos esses desafios, o licenciamento apresenta uma série de pontos positivos que pode ajudar a alavancar o negócio. Desde que bem implantado, ele pode incrementar resultados ao longo do processo de implementação e de operações de empreendimentos.
Os setores com grande potencial de impacto social e ao meio ambiente são aqueles que se encontram mais estruturados para o atendimento às necessidades do processo de licenciamento sócio ambiental. Indústria química, óleo e gás, mineração e siderurgia são segmentos onde o processo de licenciamento ambiental pode apresentar tal complexidade que demande uma robusta estrutura de profissionais, sistemas e processos para que o empreendimento não seja afetado pela falta de atendimento de algum condicionante de licença.
De forma a apoiar os programas de aceleração do crescimento, recentemente uma comissão do senado aprovou uma PEC derrubando o licenciamento ambiental em troca da simples apresentação do estudo de impacto ambiental (EIA), de forma que obras não seriam mais suspensas e/ou canceladas. Isso poderia ferir uma série de pactos dos quais o Brasil é signatário.
Estar preparado para um processo de licenciamento sócio ambiental sem entraves, atrasos e sobre custos é sorte para poucos, porém existe um espaço tremendo para otimizações e melhorias que as organizações, em momentos de extrema redução de custos e de investimentos, deveriam estar atentas.
* Andre Donha é diretor da KPMG
Fonte: KPMG